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Pedagoga pela UNEB e Especialista em Docência Superior pela Universidade Gama Filho. CONTATO: ivelima1973@gmail.com

quarta-feira, 2 de março de 2011

PRÁTICAS AVALIATIVAS NO ESPAÇO ESCOLAR

O artigo abaixo apresentado tem por objetivo apresentar as principais questões que envolvem a construção de uma prática de avaliação diversa da tradicional, que seja ferramenta para subsidiar a verdadeira construção de conhecimento, e não apenas para classificar e reprovar alunos.
Para isso, será necessário, inicialmente, definir qual a perspectiva de avaliação que acreditamos ser a mais adequada à construção do conhecimento pelo aluno, após o que será feito um levantamento do cenário atual em termos de avaliação, demonstrando o quanto as práticas tradicionais ainda permeiam o espaço escolar, bem como os possíveis fatores que determinam e influenciam essas práticas avaliativas nas escolas. Por fim, serão analisadas as questões relativas à formação do professor.
Demo (2004) afirma ser o objetivo máximo da avaliação a aprendizagem, ou seja, o aspecto pedagógico, o que muitas vezes, dentro do espaço escolar, acaba sendo preterido, em decorrência do modelo de avaliação, da concepção dos professores de cada escola. Assim ele argumenta a necessidade de se criar outros instrumentos de avaliação que não a prova simplesmente, apresentando uma postura crítica em relação aos educadores que, numa postura extremista, acabam por abolir a avaliação em si e não apenas a concepção tradicional que já não atende mais às necessidades contemporâneas
Os professores compreendem de forma equivocada o que vem a ser uma mudança nas práticas avaliativas, como afirma Hoffmann, ao confundir “não reprovação” com “não avaliação”, “como total eliminação da prática avaliativa nas escolas” (Hoffmann, 1998, p.22). Ela comenta, por exemplo que não se deve simploriamente aceitar tudo que o aluno fala ou faz, mas sim, considerar, valorizar e isso exige “a reflexão teórica necessária para o planejamento de situações provocativas ao aluno que favoreçam sua descoberta, o seu aprofundamento em determinada área do saber” (Hoffmann, 1998, p.106).
Por outro lado, é evidente o descrédito por parte das famílias dos alunos em relação às práticas avaliativas inovadoras, como afirma Hoffmann: “a preocupação que os pais demonstram com a possibilidade dos seus filhos estarem recebendo uma ‘instrução’ de baixa qualidade, por professores despreparados, e que se utilizam de uma metodologia menos exigente em relação aos seus filhos...” (Hoffmann, 1998, p.92), acaba levando os professores a recaírem em práticas tradicionais.
Outro aspecto a ser analisado é a concepção tradicional de avaliação, visto que traz conseqüências negativas para o processo educativo e para o aluno pois existe uma unif
diferentes soluções às tarefas sucessivamente apresentados pelo professor” (Hoffmann, 1998, p.72). Além disso, a avaliação mediadora também pressupõe a observação individual do processo de construção do conhecimento de cada aluno. Assim, o indivíduo, nesta concepção, passa a ser considerado ativo diante de uma tarefa proposta e os registros de avaliação também passam a ser “anotações significativas sobre o acompanhamento dos alunos em seu processo de construormização, uma padronização dos alunos, numa concepção “behaviorista” da aprendizagem neste modelo de avaliação, como se qualquer assunto pudesse ser ensinado a qualquer aluno. Discutir o fracasso escolar, dentro desta concepção, acarreta “delinear a incompetência do professor em transmitir o assunto com eficiência ou encontrar o estímulo adequado para despertar a motivação pelo tema em estudo. Por parte do aluno, significa analisar o caráter de sua desatenção ao estímulo selecionado ou incapacidades várias de perceber aquela experiência como lhe foi apresentada” (Hoffmann, 1998, p.43). Este aluno, portanto, não corresponde ao ideal do “bom aluno”.
É preciso, portanto, conceber a aprendizagem não como “sucessão de aquisições constantes” mas antes, admitirmos as diferenças individuais dos alunos e que o entendimento dele sobre uma questão “ocorre diferentemente de acordo com a sua vivência anterior, sua compreensão própria das situações” (Hoffmann, 1998, p 55). Ao adotar uma postura diferente diante do ato de ensinar e da prática avaliativa a afirmação de que “o aluno não aprende” torna-se incoerente, tendo em vista que a aprendizagem, como processo, é continua, permanente.
Holffmann (2001) também comenta que a concepção tradicional, behaviorista da avaliação, do ensino de modo geral, acaba por induzir o aluno a repetir a resposta esperada e não manifestar suas idéias e hipóteses sobre o que está estudando: “a ação corretiva tradicional vem sugerindo às crianças e jovens a elaborar suas respostas como o professor espera que sejam elaboradas... Do ponto de vista do seu desenvolvimento, tornam-se absolutamente passivos diante de tais posturas autoritárias de correção dos professores” (Hoffmann, 1998, p.71). Também comenta mais adiante que “a prática tradicional coloca um ponto final a cada tarefa que o aluno faz... o registro dos erros e acertos permanece inalterável... O professor, assim, anula o caráter de continuidade da sua própria ação educativa e impede o progresso natural em termos de processo de conhecimento” (Hoffmann, 1998, p.83).
Moretto (2002), por sua vez, discute a ênfase memorização de conteúdos como sinônimo de aprendizagem dentro do modelo tradicional de avaliação, reforçando a imagem do professor como aquele que detém o conhecimento e o transmite ao aluno, que deve memorizar e reproduzir na prova. Ele ressalta a importância de se estabelecer objetivos claros e estratégias compatíveis com estes, o que irá possibilitar ao professor avaliar se as metas foram atingidas e quais as melhores formas de ensinar o que pretende.
Pedro Demo (2004) amplia o olhar sobre a questão da avaliação, afirmando que não basta reformar o processo avaliativo, mas sim reformular toda a escola e a sua proposta pedagógica. Ele critica severamente o outro extremo das praticas avaliativas na rede pública, da progressão automática, que se transforma em “promoção automática”, ao abolir a essência da avaliação e acreditar que, fechando os olhos para as dificuldades na aprendizagem e permitindo que os alunos passem de ano sem que efetivamente construam conhecimento, estão favorecendo processo educativo, tendo em vista reduzir o índice de repetência e reduzindo a distorção série/idade. Mas de que adianta estas alterações estatísticas se, na prática, isto resulta em sujeitos incapazes de pensar, de compreender o que lêem, de analisar criticamente.
Por outro lado, se adotar uma prática avaliativa mediadora, o professor irá proporcionar aos alunos momentos para expressar suas idéias, para observar as hipóteses construídas por eles e para discussão a partir de situações desencadeadoras. Hoffmann declara que “é importante que se respeite o saber elaborado pelo aluno, espontâneo, partindo de ações desencadeadoras de reflexão sobre tal saber, desafiando-o a evoluir, encontrar novas e
ção do conhecimento” (p.84).
Dentro de uma concepção de avaliação como prática mediadora, a questão da subjetividade deixa de ser um problema, pois o momento da correção deixa de ser um momento de verificação e passa a ser “um momento de reflexão sobre as hipóteses que vierem sendo construídas pelo aluno e não para considerá-las como definitivamente certas ou erradas”. Ainda sobre a questão dos instrumentos de avaliação, a autora ressalta que a finalidade da escola não é seletiva e eliminatória como em concursos ou vestibulares, que exigem um instrumento de avaliação o mais objetivo possível.
A finalidade da escola é antes formativa, e as tarefas realizadas “deveriam ter caráter problematizador e dialógico, momentos de troca de idéias entre educadores e educandos na busca de um conhecimento gradativamente aprofundado” (Hoffmann, 1998, p.65-66). Se o professor admite as diferenças individuais e, consequentemente, nas respostas, nas estratégias desenvolvidas para a solução da situação problema apresentada, está contribuindo para a formação de jovens autônomos e críticos, cooperativos e transformadores da sua realidade.
É relevante também, tendo em vista esta mudança nas práticas avaliativas, a questão da formação do professor, cujo espaço de reflexão sobre a avaliação, quando muito, se resume a uma disciplina. Isso tem como conseqüência direta o fato de não se adquirir, mesmo na formação acadêmica de nível superior, competências relativas ao ato de avaliar. Há, de acordo com Hoffmann, grande ansiedade por parte dos professores ao exercer essa prática, pois, embora insatisfeitos com os rumos da avaliação, não aprenderam a agir de outro modo em sala de aula. “...o professor raramente é levado a expressar livremente opiniões, fazer relatos sobre sua prática, analisar teoricamente situações vividas. Burocraticamente, elabora planos formais, sintéticos e objetivos, e não faz relatórios” (Hoffmann, 1998, p.179).
Moretti (2002) apresenta algumas atitudes inerentes a um professor mediador como por exemplo o grau de conhecimento que ele tem do contexto social do seu aluno, trabalhando as características do grupo, valores, conceitos, linguagens e atitudes, formando um perfil que o permita adequar o planejamento e as estratégias que irão orientar sua prática pedagógica. Outra atitude esperada, na perspectiva da mediação como modelo de ensino, é que o professor deixe claro no início da aula os objetivos propostos para determinado conteúdo trabalhado, retomando tais objetivos durante e ao final da aula, de modo que os alunos percebam para onde estão sendo conduzidos.
Cabe também ao professor, dentro da perspectiva construtivista e formativa da avaliação, o desenvolvimento das zonas de desenvolvimento proximal de seus alunos: “o professor precisa ter a sensibilidade e a competência para perceber se os alunos têm potencial para aprender significativamente as questões propostas” pois, “quanto maior for esta zona, maior é a probabilidade de problemas abordados pelo sujeito serem resolvidos sem o auxílio de outros. É a esta concepção que chamamos de autonomia intelectual” (Moretti, 2002, p.57-58).
Jussara Hoffmann (2001) trata do tema avaliação, tratando no que ela acredita ser o âmago desta questão: a formação do professor. Ela parte da premissa de que a maior parte dos professores, principalmente da Educação Infantil e do Ensino Fundamental, não possuem graduação em nível superior e que, diante da falta de perspectiva dentro do sistema, ingressam em cursos de formação para o magistério, que se tornam “menos seletivos no ingresso e menos exigentes em carga horária, currículo, solicitação de leituras, avaliação, para adequar-se às características dos alunos, em sua grande maioria trabalhadores ou já professores” (Hoffmann, 2001, p.99). Disso resulta que o professor, uma vez que não se torna sujeito em sua própria aprendizagem, não tem construções ou processos reflexivos em sua formação, também não podem proporcionar este tipo de oportunidade aos seus alunos. Tais professores não são produtores de conhecimento, mas apenas consumidores.
Para modificar este cenário é necessário não só o conhecimento do desenvolvimento infantil, mas também discussões e pesquisas, construção efetiva de conhecimento para que possam ressiginificar sua prática e compreender o sentido das suas ações, posturas e propostas pedagógicas. De acordo com a autora: “É preciso criar espaços para ouvir o grupo de pessoas envolvidas... refletir sobre suas concepções e posturas, na busca de convergência de significado do seu grupo de trabalho” (Hoffmann, 2001, p.112). Isso inclui reuniões constantes, que precisam ser consideradas importantes e não “perda de tempo” como se vê em escolas e universidades.
Outro aspecto importante discutido pela autora é a desatualização do professor, pois, todos os profissionais, de todas as áreas, estão em constante processo de estudo e leitura para manter-se no mercado de trabalho, mas, no que se refere à educação, muitos professores se acomodam ao seu curso de formação e não entram em processo de formação continuada e permanente, ou seja, não acompanham as mudanças: “não possuem o hábito da leitura e do estudo continuado” e as instituições, por sua vez, “não investem em bibliotecas para professores”. As conferências, os seminários e cursos são, via de regra, exclusivos para supervisores que funcionam como agentes multiplicadores para os professores, limitando suas possibilidades de aprendizagem.
Hoffmann (2001) afirma que “a maioria das escolas não consegue promover mudanças significativas em avaliação porque seus professores agem movidos pela obediência a regimentos” e conclui que urge “criar espaços de interação, de discussão” que “devem resultar decisões compartilhadas, assumidas pelo conjunto de professores responsáveis”. É preciso torná-los “protagonistas ao invés de ouvintes passivos e/ou cumpridores das decisões (Hoffmann, 2001, p.116).


REFERÊNCIAS:
DEMO, Pedro.  Ser Professor é cuidar que o aluno aprenda. Porto Alegre: Mediação, 2004.
DEMO, Pedro; HOFFMAN, Jussara; LA TAILLE, Yves de. Grandes Pensadores em Educação: desafio da aprendizagem, da formação moral e da avaliação. Mediação: Porto Alegre, 2001.
 HOFFMAN, Jussara. Avaliação Mediadora: uma prática em construção do pré-escolar à universidade, 12ª Edição, Mediação: Porto Alegre, 1998.
 MORETTO, Vasco Pedro. Prova: um momento privilegiado de estudo não um acerto de contas. 3ª edição, Rio de Janeiro: DP&A, 2002.